MICROFONES - Estudo (simplesmente mic)

O microfone é a arma do cantor, do palestrante ... enfim, do astro cultural. A variedade de microfones disponíveis pode confundir um pouco sua aquisição.
Estou autorizado? Tenho uma linda coleção de mics (já tive bem maior) e trabalhei nos mais famosos estúdios do mundo.
A idéia é economizar ao máximo com satisfação. Nesse assunto, nada é taxativo (existem excessões e controvérsias).
Marcos Ficarelli

PREÇO

Não há preço. Tenho 2 mics que custaram R$50 cada (marcas diferentes - não-pirata) e são perfeitos. Tive outros de U$250 horríveis e não gostei de alguns por U$2500. Esqueça o assunto. Antes de comprar, peça para ler o manual. Verifique as especificações e principalmente a curva de resposta. Se você entendê-la, poderá escolher um que se aproxime do pretendido. O resto é sorte.

SOM

Existem 2 tipos de mic.

• Timbrados: que possuem curva de resposta desenhada para um uso específico (ex: cantor, bateria). São mais práticos para quem não entende de equalização e portáteis para quem varia de local levando somente o microfone (garante um certo estilo)
• Linear: resposta igual em todas as frequências (alcançadas). Exigem largo conhecimento de equalização. Permitem maior qualidade, mas nem sempre.

Cuidado: Existem muitos microfones cuja curva natural não é a especificada e sim corrigida (circuitos internos, buracos ou espumas no corpo). Em geral são piores. Quanto mais natural for a curva do driver, mais nítida a sua captação.

DIREÇÃO (resposta polar)

Temos 5 tipos de mic, cada um com aplicação específica.

• Omni-directional ou Non-directional: pega o som pelos 180º igualmente, sem efeito de proximidade. É límpido para gravações de todo tipo. Tipicamente o mic de gravador. Não deve ser usado em palco (PA) porque dá microfonia (feedback, realimentação, apito).
• Cardioid: direcional, capta uma região em forma de coração onde a ponta é a frente voltada para o cantor. Necessita ter corpo comprido como filtro acústico. Quanto mais próximo o cantor, mais grave a captação (curva variável). O padrão é o Shure 58.
• Hyper-Cardioid: Como acima, porém com alcance mais distante. Em geral são mais caros e de melhor qualidade, porém exigem maior conhecimento na manipulação ou canto. Só enxergam à sua frente (lateral = 0). Existem muitos exemplos, entre eles os usados em câmaras de video (canhão).
• 8 ou Figure-Eight: em geral é a comunhão de 2 drivers. Capta como 2 cardioids (frente e traz - esquerda e direita, como quiser). É mais usado em gravações (um fica de frente para o outro). Ótimo também para a captação live. Em geral, são mics de condensador grande e caros.
• One-Point Stereo: São 2 mics num só corpo, dispostos a captar espacialmente e perfeitamente o ambiente. Em geral, estão dispostos a 45 gráus. O mais famoso e antigo, o Sony ECM-99 é perfeito.

FORMATO E TAMANHO

Em geral, quanto maior melhor. Basicamente um mic é um altofalante inverso, que ouve. Como eles são sempre pequenos (por maior que sejam), têm mais dificuldade em captar os graves.

Os agudos são captados pela leveza do driver (cone, fita) e a presteza do leitor magnético.

Como exemplo, a Shure Bros. era famosa por suas cápsulas para toca-discos (moderníssimas, baratas e leves - em 1962). Para aperfeiçoar o mic foi facílimo.

DRIVER (diafragma)

São 4 tipos: cada um com seu uso.

• Dinâmico: verdadeiramente um alto-falante com caixa acústica. Por isso é mais barato, robusto e muito apropriado para a "estrada". Qualidade baixa porém muito usável na captação de voz, bateria e sons médios.
• Condensador: são captadores mais sensíveis, enclausurados (existem excessões) e que dependem de um circuito eletrônico. De todos os preços e usos. Em geral a qualidade é boa mas nem sempre apreciada pelos cantores. Não são robustos, quebram mais fácil. Usam pilhas (dificilmente fontes).
• Condensador-Grande: São profissionais, caros, grandes e pesados. Por isso usa-se somente em estúdios onde sua qualidade ressalta. Não se justifica seu uso na estrada. Usam fontes, Phantom-Power (uma linha de 48V existente em mesas de som modernas) ou conexão USB, Firewire etc.
• de Fita: como acima porém com um transdutor em forma de fita. Muito sensíveis e nítidos. Sempre caríssimos.

CONEXÃO

• Em geral os de Condensador são balanceados usando fios de 3 vias e conector XLR (Cannon/Switchcraft). Outros de Condensador têm saida preamplificada (Aux, USB). A perda de som no cabo é considerada Zero.
• Os Dinâmicos são não-balanceados (unbalanced). Muitos usam conector Cannon por praticidade mas existe perda na linha (um fio de 2 vias-shield). Para atenuar o problema, muitos (todos hoje em dia) fabricantes produzem microfones de baixa impedância (200 Ohm) que se aliam a entradas de altíssima (500k+ Ohm) na mesa. É um casamento por excesso. Funciona.

IMPEDÂNCIA

Pergunta: Devo casar a impedância do microfone com a do mixer? = NÃO. Isto é coisa muito antiga, bem antes da invenção do transistor e dos valvulados hi-fi. O uso de bridging (lo-2-hi) acabou com isso. A entrada do mixer é de altíssima impedância (2k a 500kOhm) onde, neste caso, toda entrada de microfone (150 a 600Ohm) é de baixíssima impedância.

ACESSÓRIOS ETC.

• Exceto mics de estúdio, não compre um mic sem a chave on-off.
• Não aconselho comprar mic sem filtro hi-pass (corta os graves - anti-puff, ativo). Em geral os dinâmicos cardioid possuem atenuação natural (caso do Shure 58 - mas não é igual). Cuidado: sem esse filtro a equalização é uma lástima. Nota: certas mesas possuem filtro hi-pass na entrada, que não exclui o uso duplo (pode usar os dois)
• Um bom microfone de condensador sempre tem um atenuador de volume (porrada), de -10 ou -20dB. É necessário (ainda mais para os grandes) senão, é necessário cantar bem afastado (min. 20cm)
• Um mic realmente completo e profissional tem a chave "geral" de direção: Omni, Card, 8
• Nunca (prometa!) use espumas ou telas anti-puff. Pode ser bonito mas é uma porcaria, acaba com o som. Alguns mics possuem uma leve tela interna: neste caso, se cardioid, faz parte do conjunto e é melhor não mexer. Em outros casos ... meu Deus!
• Tripé é um ítem de máxima importância. Infelizmente, na maioria, é barato e ruim. Tem de ser leve, estável, portátil, fácil de regular e não pode transmitir qualquer vibração ao corpo do mic. Tarefa difícil para um ítem barato.

Nota: alguns microfones conectam diretamente a plug-ins (prés dedicados dele). Em geral são ótimos (leia o manual sempre).

QUALIDADE

O tempo passa e a qualidade melhora. Vou contar um caso para pleno entendimento:

Em 1972 compramos na Inglaterra, microfones Sony profissionais porque eu sabia que eram ótimos e baratos (média U$200). Me apaixonei pelo 23-P para gravação de cantor (era ligar e gravar, flat). Um dia vendemos o Estudio e lá se foi ele.

Em 1986 fui procurar um semelhante e não encontrava (para eu cantar). Por acaso tive uma reunião com um técnico da Sony japonesa e lhe perguntei sobre o 23-P. Ele falou que me arrumava um.

Passou uma semana e recebi um telefonema. Era de uma loja na Sta. Ifigênia dizendo que "os" mics estavam me esperando. Cheguei lá e falei que era só um que eu precisava, não mais. O dono da loja me disse que vieram 4 e que eu aproveitasse porque foi um "pacote especial". Gaguejei e perguntei qual o preço: "- Quinze" - respondeu.

"- Quinze o que?" ... era 15 paus mesmo (cada um), como reais hoje. Levei os 4 e usei por 10 anos. Uma jóia.

O final da história é que telefonei para o homem da Sony e perguntei porque aquele preço, etc.

"- Hoje, com a tecnologia existente (robot), não dá para fazer um produto imperfeito e nem mesmo usar material barato. Só existe o perfeito. Estes que te arrumei faziam parte de um novo aparelho simples que estamos fabricando."

Nem sempre é assim. Alguns fazem porcaria (daí, pesquise). A Sony fechou sua fábrica porque não dá mais dinheiro (também ...)

É só um conselho:

• Tenha muitos e conheça a todos
• Teste-os sempre e cuide bem dos contatos e estrutura
• Use bons fios e conectores
• Revise sempre as entradas da mesa ou amp
• Guarde-os bem almofadados, no seco e perfumados
• Caiu (de boca, no tripé)? Jogue fora!

Se você cumprir isso tudo, poderá gastar pouco e tê-los por muito tempo. O principal é que poderá confiar nêles. Por isso eu tenho muitos.

Os dinâmicos baratos são ótimos quando aparece muita gente (o que não exige qualidade e, se quebrar ... tudo bem). Pelo preço quase de graça, quebram um galho.

Os de condensador baratos quebram fácil mas podem surpreender em qualidade (vide caso).

Os dinâmicos caros são os mais difíceis de comprar. Parecem todos iguais mas são muito diferentes (daí comprar o Shure 58 no escuro). Neste caso, antes de gastar (em geral é para o cantor - the Money Channel), pesquise, pergunte e ... Deus lhe ajude. A exemplo, usávamos no Codigo90 uma marca japonesa (Primo) que era o máximo. Demorou muito para conferir que eram eles os fabricantes dos melhores do Japão.

SEM-FIO (WIRELESS)

Que você quer? Você perde qualidade (mesmo) mas ganha mobilidade. O uso de wireless em tripé é um crime que só se justifica com a preguiça (ninguém é de ferro!) de ligar fios.

• Os Cardioid (enormes - pirocão) wireless são bons e baratos. Exigem pilha potente (compre a mais potente - recarregáveis só originais de fábrica).
• Os Omni de orelha (Headset) são ótimos e muito usados na TV (Ana Maria Braga) e, claro, não servem para cantor de palco.
• Os Cardioid de orelha são sofríveis ou até péssimos (pela falta de corpo). Por isso vemos (ex.: Mick Jagger) cantores usando-os somente na parte frenética do show. Esquece a Britney Spears (ela quase não canta). Infelizmente é o mic que eu uso com maior frequência porque estou na frente, com guitarra e ainda posso tocar o teclado ... e rodar no palco à vontade.
• O Cardioid de orelha do cantor deve ter a haste regulável para liberar a boca e não permitir o toque com barba etc. (faça a barba antes de usar)

Operação

Emissão / Transmissão: existem 3 modos de transmitir

• FM : barato, para pequena distância e sem interferência, mas pode ser uma boa surpresa na qualidade (é FM)
• VHF : em geral é ruim. Serve para leiloeiro mas não para cantor. É barato mas sofre interferência.
• UHF : é o que normalmente se usa. Tem coisa boa e coisa ruim independente do preço.
• NOTA: hoje existem modos de transmissão difíceis de de definir. Tenho sistemas que giram em torno do Bluetooth, 2.4GHz, 5.0GHz ...

Recepção: existem muitos modos de receber

• Dedicado é aquele que vem na caixa com o mic e só para ele. É ligar e pronto. São baratos mas podem sofrer interferências de campo. Alguns possuem um mute para ruido (um noise gate), mas este dá um pequeno retardo ao religar que, nem sempre é suportável.
• Sintonizável ou de Canais(várias freq. fixadas): São mais confiáveis e caros. Permitem mudança na freqüência caso haja problema de interferência.
• True-Diversity : O True é invenção de alguma marca para dizer que o dele é melhor. O Diversity significa um aparelho com 2 receptores quase idênticos (e 2 antenas), que escolhe automaticamente qual recepção está melhor, garantindo a qualidade.
• Auto (Smart etc): É um receptor inteligente que auto-reconhece o transmissor e fixa (por protocolo) uma freqüência de trabalho. São mais caros porém perfeitos.
• Vários + Optical-Recognizing: Em palcos muito grandes onde o cantor tem muita responsabilidade, usa-se vários receptores localizados pelo palco que se encontram (fio) num aparelho de escolha opto-digital de qual o som mais nítido.
• Super-System: Grande sistema com 72 ou mais canais, automáticos, gerenciados por computador, customizável e ... vá lá. O Grammy é um exemplo.

Nota: alguns sistemas permitem regular o volume de transmissão. Se houver, sua perfeita regulagem é muito importante e requer testes de campo.

NOTA FINAL

Vou contar outro caso:

Em 1975 fui visitar o então considerado mais perfeito estudio de gravação do mundo (deve ser até agora, não digo onde).

O equipamento que possuíam ia ser trocado porque estava velho. Eram 24 canais com VU em TV de -90dB/ch, cada canal possuia ainda um VU analógico com EQ gráfico, um Processador Dolby (por ch.!!, enormes - numa sala) etc. Eu nunca pensei em enxergar -90dB. Lá eu enxergava o chiado (perto de -72dB) em cada fio.

Pois bem: se você trabalhar com um equipamento que enxerga no mínimo -66dB de pico ou -80dB RMS, então você está capacitado a medir um microfone, senão .... esquece! Lembre-se, estamos na era digital e os programas modernos permitem ... qualquer coisa.